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Desastres

Posted by on 02/03/2014

           Prezados leitores, o Carnaval está nas ruas no Brasil, e a maior parte das notícias que vejonos sites de notícias diz respeito a quem desfilou, como foi o desfile, quem beijou quem, quem chorou, quem foi um sucesso, quem foi um fracasso, quem cantou, quem dançou e por aí vai. O mundo fica suspenso para nós, brasileiros, ou melhor, para os jornalistas que escrevem as notícias e priorizam o Carnaval. Como estou a quase 10.000 quilômetros de distância e onde estou mal se percebe que estamos a 40 dias da Semana Santa, tomo a liberdade de dedicar essas linhas a outros assuntos, assuntos esses que ocuparam minha mente de turista nesses últimos dias.

        Como já disse aqui em outra oportunidade, viajar é dar-se um tempo que não nos damos normalmente para certas coisas. Estou no momento em Piedimonte Etneo, aos pés do Monte Etna, aquele que em dezembro de 2013 brindou os sicilianos com “maravilhosos” fogos de artifício. Coloco maravilhosos entre aspas porque como turista adoraria ter a sorte de vê-lo em erupção claro, aliás da janela do apartamento onde estou posso ver o pico do Monte Etna coberto de neve. Mas, para os habitantes dos arredores, é um grande transtorno financeiro, é preciso, entre outras coisas,reparar os telhados cobertos de cinzas. Aliás, nós havíamos inicialmente contratado a hospedagem com outra pessoa, mas a casa dela foi afetada pelas diatribes do vulcão e ela teve que nos dar o cano.

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         Pois bem, a vila tem exatamente 3.671 habitantes e não tem em si grandes atrações turísticas, por isso neste domingo dediquei-me a uma coisa simples que me dá um prazer imenso, tomar sol. Fui a um mirante com vista para o Mar Jônico ao fundo e para a vegetação florida à frente e sentei-me num banco. Está um frio danado aqui, danado para nosso padrões tropicais, nove graus. Eu estava toda encapotada e não há como descrever a sensação de deixar-se banhar pelo sol sem culpa. No Brasil, em vista da intensidade dos nossos raios, nunca fico muito tempo com a cara voltada para cima, penso nos raios ultravioleta, penso no câncer de pele, e no final das contas só me permito ficar de bruços para secar o corpo depois de um banho. Mas logo o que era quentura se transforma em ardência e o prazer se esvai. Aqui na Sicília, não: o vento frio soprava e o sol me acalentava. Só não entrei em alfa, ou estado de meditação, como dizem os budistas, porque ouvia os cachorros latindo e os carros que passavam de vez em quando.

          De qualquer forma, mesmo que não houvesse carros nem cachorros, eu não conseguiria deixar de pensar, minha cabeça de turista cuja vida cotidiana está suspensa por um mês fica sempre cheia de reflexões. A mais óbvia é sobre as marcas deixadas pelo Etna na Sicília, o solo cinza resultante da decomposição da lava que dizem ser muito fértil, a cor dos prédios das cidades. Diz a lenda que o filósofo Empédocles teria se matado jogando-se na cratera do Etna para tornar-se imortal: dê-se à natureza antes que ela leve você! O que certamente o famoso siciliano conseguiu foi evaporar-se no calor de 1.000 graus Celsius. A última grande erupção realmente destrutiva ocorreu em março de 1669 e destruiu dez vilas. Havendo atividade vulcânica isso significa que há terremotos também, claro,aliás a Sicília encontra-se no ponto em que a Placa (i.e. placa tectônica) Africana se encontra com a Placa Eurasiana. O pior terremoto da história da Itália foi o de 1693, que atingiu magnitude 7,4. Na quinta-feira passada, dia 27 de fevereiro, visitei uma cidade, que hoje é patrimônio histórico da humanidade, Noto, totalmente reconstruída, a partir de 1703, depois do terremoto, em um estilo barroco tardio.

        Mas não são só os desastres naturais que eu me vejo contemplando aqui na Sicília. Há também os desastres produzidos pelo homem, e o principal deles talvez seja a guerra. Um testemunho disso está em Siracusa, cidade que hospedou-me por quatro dias em Ortígia, ilha onde ela nasceu e onde fiquei em um pequeno apartamento com vista para o Mar Jônico. A principal atração da cidade é o parque arqueológico chamado de Neápolis, onde vê-se o teatro grego em que Ésquilo estreou sua peça Os Persas e As Mulheres de Atenas. Ainda hoje encenam-se peças neste teatro no verão. Há outra construção no parque que ao contrário do teatro, rende homenagem à face negra do ser humano. Já no século VI antes de Cristo explorava-se no local uma pedreira, denominada Latomia del Paradiso. Em 427 e 415 a.C. Atenas mandou expedições contra Siracusa, mas esta derrotou os invasores tanto em terra quanto no mar. Os atenienses perdedores foram feitos escravos e trabalharam na pedreira, o que deve ter sido particularmente duro, considerando que na Sicília o verão registra temperaturas de 40 graus Celsius. Pois bem, uma das obras feitas à custa de trabalho forçado é uma caverna artificial, a Orelha de Dionísio, que tem uma excelente acústica.

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         Prezados leitores, Siracusa remeteu-me à Guerra do Peloponeso, descrita por Tucídides e aos mesmo tempo fez-me refletir sobre mais uma guerra que se avizinha e que talvez possa atingir grandes proporções, envolvendo vários países. Falo da Ucrânia e na mobilização de tropas na Crimeia (dada à Ucrânia em 1954 por Khrushchev) a mando de Putin. Não vou aqui tomar partido a favor da Rússia ou dos Estados Unidos, porque não há santos aqui.Os Estados Unidos estão há anos financiando ONGs para fomentar a oposição em países que faziam parte da União Soviética com o objetivo de trazê-los para a zona de influência do Ocidente. A Rússia, por sua vez, tem um histórico imperial e como todo império já massacrou muitas nacionalidades, etnias. O fato é que a Ucrânia é o palco das disputas e como é um país quebrado, sem poder de barganha, terá que acatar ordens.

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     Ao contrário da Suíça, que no começo de fevereiro depois de seu não à imigração de cidadãos europeus foi ameaçada de “excomunhão” pela União Europeia, mas como a Alemanha depende da eletricidade comprada da Confederação Helvética para não gelar no inverno, na prática o que eram promessas de vingança transformaram-se em negociações a serem realizadas. Se Putin cortar o fornecimento de gás da Ucrânia, o país morre de frio, como defender os interesses nacionais, quaisquer que sejam eles, em tal posição? Talvez a essa altura, a melhor solução seja que o país seja dividido, o Leste que é habitado majoritariamente por pessoas de origem russa voltaria à Rússia, e a parte Oeste ficaria melhor na esfera de influênciado Ocidente, pois tem seus produtos agrícolas para oferecer no mercado comum europeu. Esperemos pelo menor número de desastres possível neste ano de 2014, que marca os 100 anos do começo da Primeira Grande Guerra, iniciada por um episódio no Leste Europeu, em Sarajevo. Que as coincidências parem por aí.

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