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Pequenas esperanças ou grandes frustrações?

Posted by on 19/10/2014

O que está em curso é uma tropicalizaçãodas regiões consideradas subtropicais, que perdem o prefixo “sub”. Em vez de quatro, elas terão praticamente duas estações: o verão, mais quente e seco, eo inverno, chuvoso e frio.

Carlos Nobre, climatologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)

Estiagem que se espalha por vários Estados já causa prejuízos bilionários

Manchete da seção de Economia e Negócios do jornal O Estado de São Paulo de 19 de outubro

O Brasil precisa de crescimento e melhor governo. Aécio Neves tem mais probabilidade de fazer isso do que Dilma Rousseff.

Trecho retirado do editorial da Revista The Economist de 18 de outubro intitulado “Why Brasil needs change”

 

                Prezados leitores, em nossa democracia tupiniquim depois das eleições há sempre o dilúvio, não no sentido literal da palavra, de quantidades excessivas de água, exatamente o oposto. Nossos governantes, passado o obstáculo da garantia do cargo cobiçado, começam a nos revelar as más notícias, que precisavam ficar encobertas por uma cortina de fumaça para que os eleitores possam se deixar iludir. É uma estratégia que infelizmente funciona. Em São Paulo, a crise abissal de água, que ameaça a economia e a vida cotidiana das pessoas no Estado mais rico do país, não impediu que o governador Geraldo Alckmin fosse reeleito.

                  O fato é que o tamanho da poça de lama em que estamos metidos foi escomoteado pelo uso do volume morto do Sistema Cantareira e pela confiança demonstrada pelo governador de que o problema será resolvido com as chuvas de verão. Nós eleitores fingimos acreditar que tudo está bem e que nossas autoridades vão dar conta do problema, porque não queremos admitir para nós mesmos que não podemos confiar nelas, pela simples e boa razão que o apertar de botões nasurnas eletrônicas a cada dois anos não é um fator suficiente de pressão para que sejam eficientes.

                Na prática, imediatamente finda a contagem dos votos, pipocaram más notícias e problemas. Coincidentemente a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo resolveu admitir que há risco de racionamento e a falta d’água em todo o Estado se espalha como fogo em capim seco. A última reserva será usada agora, a segunda cota do volume morto, mas mesmo que chova dentro do esperado, o que não é certo, dadas as mudanças climáticas estudadas pelo climatologista Carlos Nobre, é de se esperar que o Sistema Cantareira, em coma, demore anos para se recuperar, o que pode fazer com que a seca se torne crônica. Como lidaremos com o problema? Pelo modo capitalista, aumentando consideravelmente o preço da água, de modo a torná-la artigo de luxo? Se for para condenarmos a população com menor poder aquisitivo a morrer de sede, terá que haver uma transferência das populações para outras regiões do país onde haja maior abundância relativa de um bem tão essencial. Como isso será feito? Nossas autoridades pagarão o transporte para a Amazônia, onde há os maiores mananciais de água? Ou as pessoas começarão a sair do Sudeste como refugiados da estiagem, por puro desespero?

                O que dificulta a abordagem de problemas sérios como esse é que no Brasil temos uma grande dificuldade de trabalharmos com o pior cenário. Hoje quando estava pagando a conta de um café comecei a conversar com o dono do restaurante se ele estava se preparando para a escassez de água de maneira a permitir a operação do seu negócio. Percebi que ele foi pego de surpresa com minha pergunta e ele simplesmente disse que não adiantava planejar, porque de qualquer modo não haveria carro-pipa para todo mundo. O fato é que os mais paranóicos, ou precavidos, já estão estocando galões do precioso líquido em casa. É uma estratégia que faz sentido, considerando que o caos ainda não se instalou e portanto ainda é possível comprar garrafões a preços que não refletem ainda a escassez do bem. Para quem tem espaço em casa para armazená-los, então,nada melhor do que garantir pelo menos a água da comida.

                Prezados leitores,reclamei aqui do governador de São Paulo e esua estratégia de tapar o sol esturricante que evapora nossas represas com a peneira. Será que a abordagem dos fatos da vida é melhor no nível federal? Não tenho grandes esperanças a esse respeito. Lembro-me do Plano Cruzado e como os preços congelados ajudaram a eleger governadores, deputados e senadores do PMDB em 1986. Logo depois das eleições os preços foram descongelados e a mentirinha dainflação controlada caiu por terra. Talvez o otimismo natural de nós brasileiros nos leve a enfocar coisas positivas e esquecer ou minimizar as negativas, varrê-las para debaixo do tapete demodo que elas apodreçam lá dentro e sumam.

                O atual Fla Flu entre petistas e tucanos reflete esse otimismo que se fia em dados tênues. Os eleitores de Aécio e os editorialistas da Revista The Economist,que apostam suas fichas nele, parecem acreditar que a mudança de governo terá efeitos extraordinários no Brasil. A Petrobrás será mais bem gerida, a reforma tributária será feita, o governo interferirá menos na economia, Armínio Fraga, o coelho da cartola do PSDB,garantirá o controle da inflação, e assim haverá mais confiança dos investidores e inauguraremos um ciclo virtuoso de estabilidade, investimentos, emprego. Não digo nem que sim nem que não, mas o fato é que há várias condições que permanecem as mesmas e não permitem mágicas.

                  Nosso Congresso continua tão ruim quanto era, pela representação excessiva dos Estados mais atrasados e pelo total desinteresse dos eleitores pela escolha dos parlamentares. Portanto, uma reforma tributária esbarrará no mesmo conflito de interesses entre as regiões brasileiras e pela modorra legislativa. A economia mundial não anda bem das pernas e independentemente de quanto os investidores internacionais gostem ou não do governo de plantão, não teremos lámuitas benesses. Quanto à corrupção, é difícil não acharmos, diante de tantos escândalos de parte a parte, quetrocando o PT pelo PSDB estaremos fazendo algo muito além do que trocar a Camorra pela Cosa Nostra. O modo como as instituições públicas são organizadas no Brasil, com excesso de burocracia, ritos, carimbos, protocolos, faz com que elas sejam pouco transparentes e quase que totalmente imunes ao controle do povo, que parece ter coisas mais interessantes com o que se preocupar (incluo-me neste rol de alienados).

                  Prezados leitores,perdoem meu pessimismo e paranóia. Quem sabe chova torrencialmente no Sudeste no verão e a notícia da estiagem torne-se tão estapafúrdia quanto o bug do milênio. Quem sabe mudando a Presidenta pelo Presidente mude a qualidade da administração pública no Brasil? O melhor talvez seja atingirmos um meio termo e cultivarmos pequenas esperanças para não termos grandes frustrações.

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