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Democracia tupiniquim

Posted by on 26/11/2012

            Nesta semana lia na Revista Getúlio, publicação bimestral da Fundação Getúlio Vargas, uma entrevista com uma professora de relações internacionais da casa, Maria Lúcia Pádua Lima, para quem “além das vantagens de recursos naturais abundantes, agricultura forte, indústria desenvolvida e boa gestão, o país tem a garantia de uma democracia consolidada”. É de causar espanto em como se formou, mesmo em meios acadêmicos de elite, um consenso em torno da situação do Brasil, cujo elemento mais notório é a tal estabilidade institucional. Na opinião da ilustre professora, a vantagem competitiva do Brasil em relação à China é a estabilidade da nossa democracia em comparação à estabilidade inerente de regimes autoritários como o chinês.

            Essa entrevista me levou a pensar sobre o significado que no Brasil adquiriu a palavra democracia. Parece que aqui o fato de não termos mais golpes de Estado, regimes de exceção é tudo o que se pode esperar da democracia. A eleição de um candidato ungido pelo ocupante atual do cargo é uma conquista, pois significa que as políticas bem-sucedidas de estabilidade monetária e os programas de renda mínima serão continuados e aprofundados. Nossa normalidade democrática chegou a tal nível de sofisticação que votar em Dilma, Serra ou Marina será como escolher a cor da gravata: vermelha, azul ou verde tanto faz, porque estamos no caminho inexorável de nos tornarmos um “player agressivo no mercado global”. Viva a democracia brasileira, vivam as urnas eletrônicas, viva a primeira “presidenta”!

            Mas será que democracia é só isso? Será que não estamos na verdade nos atendo aos piores aspectos da democracia e sendo incapazes de lhe aproveitar as vantagens? A democracia faz com que as decisões demorem mais a serem tomadas, porque as políticas governamentais estão mais sujeitas à influência de grupos de pressão, que podem impedir que medidas mais enfáticas sejam tomadas. A China não tem esse problema: seu governo consegue estabelecer uma estratégia definida de inserção do país na economia globalizada, mesmo que ela implique haver grandes perdedores: os indivíduos que perdem sua propriedade para os incorporadores imobiliários,  os habitantes das cidades que sofrem com a poluição causada pela industrialização a todo custo, os pescadores e agricultores que perderam seu meio de vida com a construção da faraônica usina hidrelétrica de Três Gargantas.

            O Brasil, por ser uma democracia, não consegue fazer valer medidas tão drásticas como as que a China consegue. Por outro lado, a democracia permite o debate e o debate supostamente leva ao aprimoramento das políticas públicas. Se houvesse debate na China talvez eles não tivessem tantos problemas ecológicos, tantas pessoas sentindo-se injustiçadas com desapropriações. Será que no Brasil fazermos uso dessa vantagem?

            A resposta óbvia é não, como se pode ver nessas eleições. Não houve nenhuma discussão séria a respeito da situação do Brasil, todos os candidatos só tecendo loas ao status quo e prometendo fazer ajustes finos. Críticas são inexistentes. E teríamos muitos motivos para tal. A educação no Brasil é um descalabro, descalabro porque mesmo nossas melhores instituições estão a ano-luz de padrões aceitáveis nos “grandes players globais”: as escolas mais bem colocadas no ENEM conseguem apenas um desempenho mediano (nota 6) se avaliado de acordo com o teste internacional  PISA; nossa melhor universidade, a USP, fica no pelotão das 150 melhores universidades do mundo de acordo com o ranking da Universidade de Jiao Tong da China, sendo ultrapassada de longe por universidades de países com população infinitamente menor, como Israel e Finlândia. Nossa infra-estrutura está em frangalhos e não há PAC que possa resolver isso sem uma discussão séria de como poderemos aumentar nossa capacidade de poupança para realizar os investimentos necessários. O crescimento brasileiro está baseado no endividamento, tanto das famílias quanto do governo, nos sujeitando às oscilações do mercado financeiro mundial. O Brasil está envelhecendo antes de ter enriquecido e não há ninguém na mídia, na classe política que nos lembre disso.

            Enfim, parece que a democracia em terras tupiniquins contentou-se em resumir-se a um consenso em torno de um mínimo denominador comum. Vamos indo, empurrando com a barriga nossos problemas estruturais e focando apenas no pouco que deu certo, sem nos preocuparmos com o muito que se não resolvido, pode se revelar catastrófico. Viva a estabilidade democrática!

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