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Dúvidas existenciais

Posted by on 29/11/2012

                Há várias coisas neste mundo que me intrigam e gostaria de compartilhar minha perplexidade com vocês leitores do Montblatt, por meio de perguntas. Aqui vão elas:

                Por que eu devo me sentir inferiorizada por não ser fã incondicional da tecnologia?

           Essa pergunta sempre me vem à mente quando alguém faz questão de se mostrar superior a mim porque está mais antenado com as últimas novidades tecnológicas. Há alguns anos uma amiga gozou da minha cara quando saquei da minha bolsa um celular de 99 reais e me incitou a comprar outro, porque um celular daquele “não dava”. Claro, ela tinha um aparelho melhor do que o meu, mas em compensação eu tinha e tenho emprego com carteira assinada, benefícios trabalhistas e todas “as regalias” que querem tirar de mim para aumentar nossa competitividade. Minha amiga mais bem equipada tecnologicamente vendia biscoitos em uma feira em Moema aos domingos. Quem é mais moderna, eu ou ela, que literalmente não tem onde cair morta?

           Mas o pior para mim é quando falam que a geração Y é mais inteligente, ou melhor, “tem mais conexões neuronais” porque sabe tudo de computador. Ouço isso de psicólogos e tenho calafrios. O que vejo na faculdade é que alguns membros da geração Y utilizam seus conhecimentos para ficar navegando no facebook durante a aula, incapazes de prestar atenção ao que o professor fala. Se inteligência hoje em dia significa saber pular de uma janela a outrado notebook sem conseguir concentrar a mente e colocá-la para realizar algo eu prefiro ser analfabeta tecnológica.

            Por que exigir a manutenção de certos padrões é considerado algo elitista e ruim?

         Na semana passada eu assisti a uma palestra na empresa sobre gerenciamento do tempo dada por uma consultora de recursos humanos com duas pós-graduações. Apesar de seu alentado currículo, a mulher não colocava o plural em nenhuma palavra que o exigisse. E a apostila que nosentregou estava cheia de erros de português, os quais eu apontei a ela ao final da sua fala. Quando comentei o episódio com uma colega de trabalho, ela disse: “Na boa, acho que você está exagerando.” Fiquei a princípio me sentindo a exagerada, mas depois pensei: “Oras bolas! Já tenho que aturar ouvir falar em “time” quando não há ninguém jogando, palavrinhas-chave do mundo corporativo como “sinergia”, “alinhamento”, “budget”, “compliance”, “tomar ações” e outras pérolas do ingsoc martelado diariamente. Por que ainda tenho que ouvir alguém maltratar ainda mais minha vilipendiada língua e ainda considerar isso normal e inclusivo? Por acaso democracia é somente nivelamento por baixo ou é dar oportunidades reais a todos de desenvolverem suas potencialidades? Aliás, depois que eu apontei os erros à palestrante ela me perguntou se eu gostaria de revisar o livro que está escrevendo.

            Por que as pessoas sempre pressupõem que para tudo há um jeitinho?

        Essa pergunta me veio à mente quando um colega da faculdade hoje me relatou uma singela indagação de um amigo: “Qual o esquema para entrar na universidade pública?” Ao que ele respondeu: “Ué estudo!” É realmente impressionante como está entranhado em nossa cultura essa ideia de haver um caminho fácil para conseguir coisas que povos menos “espertos” levam décadas. Tal traço cultural se revela facilmente pela quantidade de palavras que usamos para designar o jeitinho: “esquema”, “mutreta”, “mutretagem”, picaretagem”, “bem bolado”, “bagulho”, “costura política”, “pacto nacional”, “flexibilização” e por aí vai. Não admira que entra governo e sai governo no Brasil e cortes pontuais de tributos sejam considerados política industrial, fazer a corda arrebentar do lado mais fraco, o dos trabalhadores, vire política de fomento à competitividade, e dar uns trocados para que a pessoa não passe fome vire política social. Enquanto isso as famílias continuam inviabilizadas pela falta de oportunidades de qualificação e emprego, a indústria continua sendo desmantelada por falta de infraestrutura física e humana e a economia cresce a taxas muito menores do que é o necessário para o país mudar de patamar de desenvolvimento.

          Por que é tão difícil às pessoas pensar de maneira não maniqueísta?

         No sábado passado fiquei o dia inteiro em treinamento para a empresa sob a batuta de um ex-palhaço que nos levou a um orfanato fora de São Paulo e nos fez fazer trabalho “voluntário” para melhorar as instalações das crianças. Nos intervalos ele falava de quanto estava feliz em imaginar a alegria das crianças quando vissem tudo bonito, chorou várias vezes e chamava a mulher dele no palco com a filha de colo para mostrar seu lado família. Tudo, claro, seguindo o script ditado pela empresa para nos inculcar os valores de trabalho em grupo, colaboração, espírito de equipe e de doação e, mais importante, nos orgulharmos de trabalharmos em uma empresa socialmente responsável.Eu comentava isso com uma colega (outra) e ela retrucou que “não achava que ele estava mentindo”. Eu então esclareci que não o achava um mentiroso, apenas um hábil palestrante que se utilizava de certas armas (causar comoção e empatia) para atingir determinados objetivos. Meu intelectualismo claro só piorou as coisas e ela se calou sem querer conversdar comigo.

        O fato é que ao menos coletivamente somos bipolares em nossas escolhas: ou é Fla ou é Flu, ou é PSDB ou é o PT, ou é monetarismo ou é desenvolvimentismo, ou é direita ou é esquerda,ou é conservador cruel e reacionário ou é progressista sensível, ou é política externa independente ou é vassalagem ao imperialismo, ou é imprensa golpista ou imprensa chapa branca, ou é evangélico fundamentalista ou é ateu militante, entre tantas outras polêmicas. Esses maniqueísmos definitivamente não nos ajudam em nada a resolvermos nossos problemas porque ficamos obcecados em destruir o outro e fazer valer nossas certezas ideológicas.

       Bem, essas são algumas das minhas dúvidas existenciais. Eu apenas expus o problema e agradeço se alguém me der uma resposta não maniqueísta, reta e em bom português a alguma delas.

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