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Sindicato de ladrões

Posted by on 08/06/2014

O que tinha para ser roubado já foi.

Joana Havelange diretora do Comitê Organziador Local da Copa do Mundo

A Comissão Europeia publicou seu primeiro relatório oficial sobre a corrupção na União, cuja extensão o comissário autor do documento descreveu como de tirar o fôlego: em uma estimativa conservadora, a corrupção custa à União Europeia tanto quanto todo o orçamento da organização, algo em torno de 120 bilhões de euros – o número real sendo “provavelmente muito maior”.

Perry Anderson, historiador e professor na Universidade da Califórnia, no artigo “O Desastre Italiano”, publicado no London Review of Books em 22 de maio de 2014

                Prezados leitores, a corrupção é um tema caro a nós brasileiros. Vira e mexe ela aparece como fator de grande influência política. Para quem se lembra, Fernando Collor de Mello foi eleito para presidente pegando carona na luta contra os marajás de Alagoas. A onda de protestos que ocorreu no Brasil no ano passado teve como mote a falta de transparência nos gastos para a Copa, o fato de que os estádios custaram muito mais do que o previsto, de que a Copa do Brasil será em termos de dinheiro despendido, equivalente à Copa da Alemanha e da África do Sul juntas. Por outro lado, apesar de o povo se indignar com a corrupção, no frigir dos ovos muitos de nós acabam relevando-a quando pensam que todos roubam, portanto no momento de escolher um candidato é melhor levar em conta outros fatores.

                   De fato, o PT tem o José Dirceu e o mensalão, o PSDB tem Eduardo Azeredo e o mensalão mineiro. O PT tem o escândalo dacompra da Refinaria de Pasadena em seu passivo, o PSDB tem o escândalo da Alstom em São Paulo, governado há décadas pelos tucanos, e portanto de sua inteira responsabilidade. Lula e Dilma eximiram-se de culpa nos dois grandes casos de “maracutaias”. O candidato do PSDB, Aécio Neves, por seu turno, em uma entrevista a uma jornalista da Revista Piauí, que o abordou a respeito da ação penal que estava no STF contra Azeredo, limitou-se a dizer que o ex-deputado mineiro é um “homem de bem” e estava “abatido”, mudando logo de assunto. Isso quando Eduardo Azeredo renunciou ao mandato para levar o processo à primeira instância e adiar o julgamento ainda mais, contribuindo assim para uma prescrição antes mesmo que haja sentenção condenatória,uma atitude sem dúvida velhaca, não condizente com alguém que não teme ser submetido ao escrutínio judicial.

                    Em suma, no Brasil parece que há um sindicato de ladrões, e lamentamos o quanto isso corrói nossa democracia, o quanto isso contribui para a falta de entusiasmo da população em votar, o desleixo com que o fazemos especialmente nas eleições para o Legislativo. Nas próximas eleições presidenciais Marina Silva tem chances de desempenhar o papel de personagem impoluta em quem serão depositadas as esperanças, cada vez mais tênues, de moralidade. Mas, será que também em um eventual governo de Eduardo Campos-Marina Silva, quando os dois realmente colocarem a mão na massa, tiverem que conseguir apoios para aprovação de projetos, tiverem que preencher cargos commissionados, em suma virem-se às voltas com o cotidiano de governar, não farão a mesma coisa que petistas e tucanos fazem há muito tempo?Será que a corrupção não é parte intrínseca do sistema?

                    Essa ideia parece ser plausível quando nos deparamos com o fato de haver grande corrupção em países com instituições muito mais fortes do que as nossas e com um povo que vota facultativamente, e portanto, teoricamente ao menos, com mais consciência. De acordo com o artigo de Perry Anderson citado acima,nenhum país membro da União Europeia escapa incólume do câncer dos “jabaculês”, das “caixinhas”. Um exemplo significativo disso é a Espanha, cujo rei Juan Carlos acaba de abdicar em favor do filho Felipe. Não é simplesmente para dar oportunidade aos mais jovens, como disse o monarca na segunda-feira, dia 2 de junho, e nem por estar alquebrado, depois de cinco operações no quadril, que está passando o bastão.

                    O fato é que o Estado espanhol passa por uma séria crise de credibilidade, pois o país está em crise e o povo percebe que suas elites vivem muito bem. Mariano Rajoy, o primeiro-ministro foi pego com a boca na botija, no caso recebendo nos últimos 10 anos 250 milhões de euros a título de propina para assinatura de contratos de construção. Tal dinheiro foi-lhe repassado por seu tesoureiro Luís Bárcenas, que está sendo processado por ter 48 milhõesde euros em contas não declaradas na Suíça. No seu caderninho de beneficiários, encontra-se outro notável do Partido Popular, o ex-diretor do FMI, Rodrigo Rato. Enquanto isso, em 2013 o índice de desemprego na Espanha atingiu 26,3%, e a Catalunha, a região mais próspera do país, planeja realizar um referendo sobre a separação em novembro que é considerado ilegal pelo governo central. Seja a monarquia, seja o prório Estado unitário, algo será sacrificado na Espanha para satisfazer a sanha do povo por mudanças, afinal em manifestações os espanhóis não se cansam de repetir “que se vayan todos”, incorformados com a desfaçatez dos poderosos.

                    Esta aí um velho novo desafio para as democracias ocidentais, como continuar representando uma população que se vê cada vez mais alienada do sindicato de ladrões. Não deixa de surpreender que ainda nos vejamos às voltas com tais tipos de problemas, afinal teoricamente a independência dos poderes, a existência do devido processo legal, a eleição direta de representantes deveriam ter sido suficientes para que não houvesse mais abusos como havia na época em que os poderosos nem legalmente prestavam contas dos seus atos. Em 31 de outubro de 1517 o monge agostiniano Martinho Lutero publicou suas 95 teses condenando a corrupção na Igreja, cuja manifestação mais gritante era a venda de indulgências. O resultado desse ato de rebeldia foi o cisma no cristianismo ocidental, que no longo prazo selou a decadência da Igreja como formadora da cabeça das pessoas.Mais de dois séculos depois, em 14 de julho de 1789, eclodiu a Revolução Francesa como uma luta pela igualdade jurídica entre os homens contra os privilégios da nobreza e do clero.Com isso, tanto a Igreja quanto o Estado, onipresentes na vida das pessoas na forma de impostos dosmais variados, tiveram seus poderes domados e tiveram que ser mais transparentes nos seus atos e prestar contas ao povo.

                     Pois bem, parece que em pleno século XXI vivemos uma situação parecida, em que as elites vivem em um mundo da fantasia em que não precisam dar satisfações do que fazem a ninguém, driblando o devido processo legal que outrora foi garantia à igualdade dos cidadãos.Tony Blair, no Reino Unido, Helmut Kohl e Gehard Schroder na Alemanha,Nicolas Sarkozy e Christine Lagarde na França, Silvio Berlusconi na Itália, Bertie Ahern na Irlanda, todos têm a ficha suja, mas continuam por aí, dando palestras, ocupando postos de prestígio, dando as cartas nos escalões do poder. Prezados leitores, talvez seja um alívio saber queo sindicato dos ladrões brasileiros seja uma pequena filial do grande sindicato mundial, mas o desafio é o mesmo: o que fazer ante os desmandos? Só o tempo dirá.

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