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Em busca do Santo Gaal

Posted by on 06/07/2014

Sentíamos que o Krul seria o mais apropriado. Ele tem envergadura. Foi-lhe dito que se preparasse, estava previsto. Se eu tivesse cometido um erro, eu teria que ter enfrentado as críticas.

Aloysius Paulus Maria Van Gaal, professor de educação física e técnico da seleção holandesa de futebol, explicando sua substituição do goleiro titular Cillessen para a cobrança de pênaltis nas quartas-de-final da Copa do Mundo.

O peculiar da vida brasileira parece ter sido, por essa época, uma acentuação singularmente enérgica do afetivo, do irracional, do passional, e uma estagnação ou antes uma atrofia correspondente das qualidades ordenadoras, disciplinadoras, racionalizadoras.

Trecho extraído de Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda

             Prezados leitores, como diria o poeta, “cessa tudo quanto a antiga musa canta que um valor mais alto se alevanta”. Se na semana passada, eu quis chamar a atenção para os dramas que estão se desenrolando no mundo afora enquanto cá estamos experimentando fortes emoções na Copa do Mundo, nesta semana farei o contrário e focarei minhas atenções em um personagem futebolístico, para mim muito interessante porque ele dá o que pensar a respeito de outros assuntos.

           Falo do rabugento e politicamente incorreto técnico da seleção holandesa, conhecido como Louis Van Gaal, e que ontem realizou seu maior feito: ao substituir um goleiro de 1,88 por um de 1,93, Van Gaal causou um abalo psicológico no time da Costa Rica, que apesar de ter um excelente goleiro,Keylor Navas, e de ter se saído bem na cobrança de pênaltis contra a Grécia, acabou sendo derrotada. Digo seu maior feito, porque Van Gaal tem se caracterizado por mostrar uma capacidade incrível de dançar conforme a música tocada nesta Copa das Copas, o que significa mudar os jogadorese o estilo de jogar do time de acordo com os desafios do momento. Aliás, ele já usou 20 dos 23 jogadores que convocou, o que mostra que se vale de todos os recursos para conseguir seu intento de ganhar o título.

               É sempre admirável ver um líder em ação, alguém que tem uma meta, sabe traçar um caminho e sabe mobilizar sua equipe para chegar lá.  Para isso, pessoas como Van Gaal nunca agradam e estão pouco se importando em agradar. O goleiro Cillessen quando saiu de campo mostrou sua irritação chutando uma garrafa de água, tendo sido pego de surpresa já que não sabia dos planos do chefe. Depois do resultado obtido, ele enfiou a viola no saco e pediu desculpas, afinal teve que reconhecer que o técnico holandês havia se preparado para o pior, isto é, a decisão por pênaltis, e que para tal decisão o goleiro mais alto intimidaria mais os batedores da Costa Rica.

     É claro que há sempre um quê de loucura nos líderes. Van Gaal pode acertar retumbantementemantendo-se fiel a suas ideias, mas de vez em quando sua autenticidade é pura teimosia. Que o diga o jogador brasileiro Rivaldo quando foi dirigido pelo holandês. Van Gaal queria que ele jogasse como ponta esquerda e Rivaldo preferia atuar no meio campo. Como Rivaldo não obedecia ao técnico este passou a persegui-lo, implicando com 20 segundos de atraso ou com a camisa para fora do calção. Acabou fazendo Rivaldo sair do Barcelona e recebendo a acusação de ter inveja. Outro brasileiro “perseguido” por Van Gaal foi Lúcio, que foi dispensado do Bayern Munique na temporada 2009 2010 quando o holandês passou a dirigir a equipe alemã.

          Em suma, todos esses detalhes futebolísticos que trago aqui levaram-me a lamentar que tipos como Aloysius Paulus Maria Van Gaal não sejam mais comuns nas nossas plagas.Pode ser que o Brasil seja campeão do mundo na base da tal da “raça”, da gana de ganhar a Copa em casa por parte dos jogadores que querem dar um presente ao povo brasileiro “patrocinador” por bem ou por mal dos custos monstruosos do evento. Será um feito incrível, e deveremos isso ao imponderável da influência das emoções à flor da pele, em virtude da saída de Neymar à base da joelhada nas costas e da vontade de vencer dos jogadores raivosos com o que foi feito ao nosso maior craque, o mártir da Copa. A mim isso não importa, porque estou interessada no mundo além futebol.

         Quantos de nós brasileiros vemos métodos racionais serem aplicados nas várias esferas da vida em terras tropicais? Antes de mais nada devo esclarecer que para mim ser racional não é reprimir as emoções, ser “travado” como dizemos aqui. Ser racional é tomar decisões baseadas nos fatos tal como se apresentam a olhos serenos e não naquilo que queremos que os fatos sejam, significa que um problema concreto será resolvido pela análiseda realidade do momento e pela estimativa dos piores cenários para que caso os acontecimentos se desenvolvam de maneiranegativa, não sejamos pegos desprevenidos.

           Voltando à pergunta, quantos de nós no Brasil somos ensinados nas escolas a resolver problemas? Minha passagem pelos bancos escolares, nos quais estive até o ano passado, sempre me deixou com a sensação de queo mais importante é cumprir protocolos, fazer provas, passar o conteúdo colocado no currículo para estar em dia com as exigências burocráticas do MEC, mas a utilidade prática de tudo aquilo não era importante, o importante era o carimbo ao final, em suma o diploma. Quantos denós no Brasil vemos obras públicas sendo construídas prevendo o pior cenário de maneira que ele possa ser prevenido e não ocorra?Nesta última semana um dos legados da Copa em Belo Horizonte, um viaduto que seria uma importante ligação para o Mineirão espatifou-se, matando duas pessoas, um triunfo da esperança de que nada de mal ocorreria, apesar de haver toda probabilidade de ocorrer, já que a prefeitura da cidade não havia fiscalizado a obra.

         Finalmente, quantos de nós brasileiros já fomos testemunhas de uma campanha política em queo radicalismo das opções absolutas dá a tônica e as discussões giram em torno do embate de personalidades, sem que seja dada importância sobre o que o candidato de fato fez? Por acaso, a disputa Dilma Rousseff versus Aécio Neves versus Eduardo Camposestá sendo apresentada em termos de eficiência objetiva? Dilma é sempre a apadrinhada do Lula, Aécio é o apadrinhado do avô, Tancredo Neves, Eduardo Campos é o apadrinhado de seu avô, Miguel Arraes, Marina Silva é apadrinhada de Chico Mendes.O que de fato cada um dos candidatos fizeram quando ocuparam postos no Executivo ou Legislativo? Isso não é importante, o importante é a peleja, o duelo dos titãs, danem-se os fatos, viva o drama, as emoções!

            Prezados leitores, tenho certeza que no dia em que considerarmos o método Van Gaal de lidar com os assuntos, sem atropelos, com objetividade e sem confiança demasiada nas boas intenções, teremos dado enormes passos para resolver tantos dosnossos problemas, e poderemos ser menos melodramáticos, menos masoquistas e martirizados do que somos hoje.

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