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Todo o poder às corporações?

Posted by on 14/09/2014

A sobrevivência do sistema corporativo … exige que o o controledas grandes corporações transforme-se em uma tecnocracia absolutamente neutra, que equilibre uma série de demandas de vários grupos na comunidade e atribua acada uma das partes uma porção do fluxo de receitas com base em políticas públicas ao invés da cupidez privada.

Trecho extraído do artigo “A Corporação Americana”, escrito por Ralph Gomory e Richard Sylla

Vejo que vocês estão nervosos com isso. Temos que tomar cuidado para não remeter aos sovietes.

Walter Feldman, coordenador-geral da campanha de Marina Silva, ao explicar em reunião com a Associação de Lojistas dos Jardins de São Pauloque os conselhos de participação da sociedade propostos pela candidata do PSB não tinham nada a ver com os conselhos populares de Dilma Rousseff

                Prezados leitores, a cada eleição presidencial em que aparece um candidato considerado de esquerda com chances de ganhar, surgem os temores sobre o que o governo faria no poder. Haverá garantias ao direito de propriedade? A democracia de alta densidade e os conselhos departicipação popular significam todo o poder aos sovietes, como aconteceu na Revolução Russa de 1917? Será uma tentativa de introduzir o comunismo em nossas plagas por vias tortas, travestido de participação democrática? São dúvidas que sempre assaltam a mente dos que têm muito ou pelo menos algo a perder em termos de bens no Brasil. Invariavelmente os candidatos que propõem qualquer ideia alternativa ao tradicional processo legislativo acabam tendo que dissipar o medo suscitado nos formadores de opinião e não raro acabam diluindo suas propostas.

                 A trajetória de Lula é um exemplo desse aparar de arestas radicais. Em 1990 o sapo barbudo iria provocar a fuga de 800.000 empresários se eleito, dizia Mário Amato, presidente da FIESP. Para tornar-se palatávelàs elites, Lula acabou adotando a ortodoxia econômica e seguindo a trilha traçada por Fernando Henrique Cardoso, ao mesmo tempo em que consegiu distribuir um pouco a renda por meio de programas de transferência. Uma no cravo, outra na ferradura, uma receita contemporizadora que permitiu a Lula ser o herói de dois mundos, o dos pobres e o dos ricos, os quais não tiveram nada a temer dele. Afinal o ex-metalúrgiconão fez desapropriações em massa para fins de reforma agrária e nem taxou as grandes fortunas, como seria de se esperar de um partido que se inspirou no socialismo em seus primórdios.

                Assim, no frigir dos ovos, o debate sobre o aumento da participação do povo nas decisões políticas e a forma como a renda é distribuída no Brasil acaba dando-se em termos pouco produtivos, porque sempre leva à descrição de cenários apocalípticos do tipo “o comunismo vem aí, vamos nos proteger!” Proteger-se significa no mais das vezes neutralizar a ameaça tachando-a de radical e subversiva, como se qualquer audiência pública para discutir o orçamento ou qualquer plebiscito fosse o mesmo que dar todo o poder aos trabalhadores como propuseram os bolcheviques.

                É uma pena que assim seja, porque no paraíso do capitalismo, os Estados Unidos, há uma discussão acadêmica sobre os rumos políticos e econômicos que o país está tomando e o papel das corporações americanas no aumento da concentração de renda, do desemprego, e do déficit comercial nos últimos trinta anos. No artigo citado acima, Ralph Golmory e Richard Sylla descrevem resumidadamente a história das corporações, estabelecendo uma diferença entre o impacto que elas tiveram desde o fim da Segunda Guerra Mundial até a década de 70 eo impacto que passaram a ter a partir da década de 80. Segundo os autores, na época áurea do capitalismo americano, os dirigentes das empresas conseguiam equilibrar os diferentes interesses das partes interessadas, acionistas, executivos, governo e trabalhadores, porque os sindicatos eram fortes, o papel regulatório do Estado era incentivado e os administradores não prestavam muita atenção ao que os acionistas tinham a dizer. Havia então um círculo virtuoso, em que a produção e a produtividade aumentavam, os trabalhadores tinham ganhos salariais e com isso tinham capacidade de consumir aquilo que as empresas ofereciam, garantindo a estas o lucro e portanto a capacidade de oferecer empregos.

                 Tudo isso começa a mudar radicalmente a partir da década de 80, com o fim da Guerra Fria e a introdução de uma ideologia liberal. O papel de fiscalizador do governo passou a ser criticado, os sindicatos perderam força, já que a ameaça do comunismo acabou, terminando com o poder de barganha deles, e um novo mantra passou a ser repetido nos meios corporativos: “shareholder value” que pode ser traduzido como a ideia de que as empresas existem exclusivamente para dar lucro a seus acionistas e esta deve ser a tarefa primordial delas. Estabelece-se uma aliança entre os executivos e os acionistas pela qual a remuneração dos primeiros é dada em parte em ações, o que os estimula a aumentar-lhes o valor, o que é conseguido com lucros polpudos. Para que os lucros sejam em níveis satisfatórios aos acionistas, qualquer expediente é válido: terceirização da produção para locais em que a mão de obra é mais barata, venda da empresa para outra para torná-la mais enxuta (leia-se, com menos funcionários) e mais lucrativa, recompra das ações da empresa.É fácil ver que tais truques podem causar graves consequências: desemprego, obtenção de receitas de manobras financeiras e não pela produção, perda de capacitação técnica pelo fechamento de instalações produtivas nos Estados Unidos.

                 Golmory e Sylla fazem um balanço negativo dessa ênfase total no aumento dos lucros por meio da globalização. O círculo virtuoso que durou de 1945 até meados da década de 70 é substituído por um círculo vicioso em que ao crescimento exponencial do retorno aos acionistas corresponde uma perda da participação do trabalho na riqueza nacional, perda do poder de consumo, diminuição do crescimento econômico, concentração do poder econômico e político nas mãos de grupos influentes. Para eles, os Estados Unidos chegaram a um ponto de sua história em que nem tudo o que é bom para a General Motors é bom para o país e vice-versa, como proclamou Charles Wilson, diretor-presidente daquela indústria automobilística nos idos de 1950, quando foi nomeado Secretário da Defesa pelo Presidente Eisenhower. A solução é uma nova mudança de paradigmas, em que o shareholder value seja substituído pelo stakeholder value, em outras palavras, que os interesses de outras partes interessadas que não sejam somente os acionistas sejam levados em conta: os interesses dos trabalhadores, do meio ambiente, dos consumidores, do governo.Essa mudança de enfoque teria que vir por políticas públicas na forma deincentivos fiscais para que as empresas fossem direcionadas a agregar valor nos Estados Unidos,e não somenteapresentar resultados positivos a qualquer custo, como têm feito desde a década de 80.

          Interessante discussão essa, relevante também no Brasil, que está igualmente se desindustrializando por conta da globalização. Caso Dona Marina Silva seja eleita, que é o que parece no momento de acordo com as pesquisas, torçamos para que ela consiga ir além da política de Lula de agradar a gregos e troianos e proponha a discussão datal da sustentabilidade em termos de um esforço para agregar valor aqui no Brasil de maneira que possamos ter crescimento econômico com distribuição de renda. Não custa sonhar!

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