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Oportunidades à vista

Posted by on 11/04/2022

A busca é por cadeias mais curtas e mais ágeis e que também poluem menos. Diferentemente de outros momentos em que a industrialização contou com apoio do governo, agora é um movimento orgânico das empresas. Por outro lado, há movimentos contrários que não ajudam, como alta taxa de juros, que tende a tornar a tomada de decisão de investimento mais demorada.

Trecho retirado do artigo “Saída Nacional – Nó das cadeias globais estimula indústrias a aumentar a produção local, publicado na edição de 10 de abril do jornal O Globo

O que é a meta de inflação na prática? É um conjunto de medidas extremamente primitivo e internamente contraditório, cuja aplicação leva a economia à armadilha da estagflação. O Banco Central estabeleceu a livre flutuação do rublo, o que é absurdo do ponto de vista das metas de inflação em uma economia aberta, na qual a taxa de câmbio afeta diretamente os preços. E vemos como a desvalorização do rublo periodicamente acelera os preços. Além disso eles reduziram a política monetária a somente uma ferramenta absolutamente primitiva – a manipulação da taxa de juros básica. Mas essa taxa é a porcentagem na qual o Banco Central empresta dinheiro aos agentes econômicos e retira dinheiro da economia. Suas tentativas de suprimir a inflação pelo aumento das taxas de juros não conseguem ser bem-sucedidas na economia atual, porque quanto maior a taxa de juros, menor o crédito, menor o investimento, menor o nível técnico e a competitividade.

Trecho da entrevista dada por Sergey Glazyev, economista russo membro da Academia Russa de Ciências e do Conselho Financeiro Nacional do Banco Central Russo à revista eletrônica Business Online Magazine em 27 de março de 2022 intitulada “Acontecimentos como este acontecem somente uma vez a cada cem anos”

    Prezados leitores, neste meu humilde espaço eu muitas vezes tracei paralelos entre a Rússia e o Brasil, com relação, por exemplo, à mentalidade criada por longos períodos de tempos em que houve servos lá e escravidão aqui. Nesta semana, o objeto dessa busca de semelhanças será a economia. Pois lá como aqui há o embate entre os monetaristas e os desenvolvimentistas e no caso específico da Rússia atualmente tal disputa se dá entre a presidente do Banco Central Russo, Elvira Nabiullina, que segue a cartilha ditada pelo FMI, e Sergey Glazyev, que já foi conselheiro de Vladimir Putin e considera que as sanções econômicas impostas ao país pelas potências ocidentais é uma oportunidade única para o país mudar de rota totalmente  e seguir o caminho da China de altos níveis de investimento, desenvolvimento técnico, crescimento econômico consistente e prosperidade. Permitam-me tentar explicar as respectivas posições e vocês verão como elas são pertinentes à própria situação do Brasil.

    O FMI é a instituição que concede empréstimos a países em dificuldades financeiras para que eles possam honrar suas obrigações internacionais. Em troca dos empréstimos o FMI exige que o país siga os princípios que ele considera darem frutos, isto é que permitem que a moeda nacional tenha um valor estável. Para isso é preciso acumular reservas em moedas fortes, principalmente o dólar americano e o euro, os quais são obtidos pela venda dos ativos do país, como obras de infraestrutura (por exemplo, portos, aeroportos, hidroelétricas) e empresas estatais a investidores estrangeiros. Acumulando reservas o país construirá a confiança no valor da moeda local.

    Tal confiança é importante porque, o câmbio flutuante, outro dos princípios do FMI, faz com que a perda de confiança no valor da moeda traduza-se rapidamente em uma fuga de capitais do país. Para evitar tal fuga e as grandes oscilações cambiais, que afetam os preços dos produtos no mercado local, o Banco Central, além de acumular reservas, deve estabelecer uma taxa de juros que impeça a desvalorização excessiva da moeda e a alta de preços, isto é a inflação.

    Um último e importante fator que estimula a confiança dos investidores globais no valor da moeda é o controle do governo sobre as contas públicas, que permita que seja gerado um superávit primário para pagar os juros dos empréstimos soberanos contraídos no estrangeiro e assim manter o fluxo de capitais para dentro e para fora do país, sem que haja perdas bruscas do valor da moeda local. Caso haja uma fuga de capitais por algum motivo há duas saídas possíveis: uma alta exacerbada dos juros ou a venda de moeda forte para sustentar o preço da moeda do país que segue a cartilha do FMI.

    E quando o país obediente do ponto de vista da política econômica foge dos trilhos na seara política? Bem, o sistema internacional, comandado pelos Estados Unidos, impõe sanções. No caso da Rússia, um valor de 350 bilhões de dólares e euros mantidos fora do país foram confiscados como resposta à invasão da Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro.  Dona Elvira Nabiullina, que foi responsável pela acumulação dessas reservas desde 2013, viu seu castelo fortificado ser bombardeado. A propósito, a eficácia de quaisquer sanções que a tal da “comunidade internacional” impõe a um país recalcitrante depende justamente de quão à risca ele segue as orientações do FMI. Pois se o valor da moeda local depende inapelavelmente da quantidade de euros e dólares acumulada, então a indisponibilidade repentina desses sustentáculos monetários faz com que haja uma desvalorização brutal da moeda, encarecendo os preços dos produtos e deixando as pessoas insatisfeitas com a carestia, o que pode encorajá-las a derrubar o governo que não está agradando a “comunidade internacional”.

    Se para a presidente do Banco Central russo as sanções impostas devido à guerra na Ucrânia são um desafio a ser enfrentado com venda das moedas fortes que a Rússia tem dentro do país e com a alta de juros, para Sergey Glazyev está é uma oportunidade única de seu país sair da camisa de força imposta pelo cânone monetarista. O Banco Central não deve ter como única meta estabelecer metas de inflação e persegui-las a todo custo, pois isso causa estagflação. Limitar a oferta de dinheiro à disponibilidade de reservas internacionais torna o país dependente de capitais externos e sujeito à ação de especuladores que lucram com as movimentações do câmbio causadas pelas flutuações nas taxas de inflação e de juros.

    Conforme explica o trecho que abre este artigo, para Sergey o Banco Central deve preocupar-se em garantir a oferta de crédito suficiente para que haja investimentos na produção que permitam à Rússia mudar de patamar em termos de desenvolvimento, inaugurando um círculo virtuoso que quebre o padrão de falta de investimentos e falta de produção em que o país esteve mergulhado desde a década de 1990, quando começou a seguir a cartilha do FMI. Nas contas de Glazyev, 50 trilhões de rublos deixarem de ser produzidos, 20 trilhões de rublos deixaram de ser investidos e o único fruto dessa política monetarista são os 300 bilhões de dólares investidos em ativos estrangeiros para acumular reservas, ativos esses que foram perdidos devido às sanções.

    E como fazer para construir a confiança no rublo sem o pilar das moedas fortes? O economista russo propõe que a China, a Rússia e outros países da Ásia estabeleçam um sistema financeiro paralelo em que as trocas comerciais seriam feitas com base no valor médio de uma cesta de moedas de produtores de commodities, as quais incluiriam ouro, petróleo, metais, grãos e água. Com base nesse padrão monetário de referência, os países ofertariam crédito localmente sem estarem obrigados a manter investimentos em títulos do Tesouro americano para que sua moeda tenha valor.

    Será que esse sistema alternativo à dominância do dólar vingará? Para Glazyev, esta oportunidade é única de criá-lo porque a Rússia, privada de dólares e euros, não conseguirá comprar produtos manufaturados no exterior dos países que só transacionam em dólares e euros, e assim terá que substituir as importações, fabricando localmente. Mas se Elvira Nabiullina permanecer fiel aos princípios que ela introjetou como verdades absolutas, ela tentará manter o valor do rublo por meio de um aperto monetário sem precedentes que fará a festa dos especuladores e dos bancos, mas diminuirá a oferta de crédito para a produção.

    Prezados leitores, considerando que nós no Brasil também seguimos a cartilha do FMI há décadas, não seria a hora de nós também agarrarmo-nos a essa oportunidade de debandada? Afinal, de acordo com dados divulgados pelo jornalista Rolf Kuntz, temos um contingente de 37,3 milhões de pessoas desempregadas, desalentadas, subocupadas com insuficiência de horas e afastadas do mercado e o PIB crescerá apenas 1% neste ano. Será que aumentando os juros como está fazendo o Banco Central para manter o valor da moeda e segurar a inflação não estaremos apenas chafurdando no círculo vicioso da falta de investimentos, de produção e de emprego? Será que o combate à inflação não seria mais eficaz se fosse abordado não do ponto de vista do fluxo monetário, mas do ponto de vista do choque da oferta de produtos por meio da substituição das importações afetadas pela disrupção das cadeias de suprimento causada pela pandemia de covid-19 e pela guerra na Ucrânia?

   Como mostra o trecho na abertura deste artigo, as empresas no Brasil estão tentando produzir localmente por necessidade, mas para que tal esforço surta efeitos e seja sustentável no longo prazo, o governo precisaria ajudar diminuindo as taxas de juros e facilitando o crédito, para viabilizar investimentos e ganhos de escala. Infelizmente, prevê-se que no Brasil as taxas de juros serão baixadas somente em 2024, segundo estimativas divulgadas na edição de VEJA de 13 de abril. Enquanto isso, ficaremos presos na estagflação, assim como os russos ficarão se Dona Elvira continuar estabelecendo a política monetária do país. Sabemos quem são os clones dela no Brasil, pois eles têm estabelecido a política econômica do país desde o choque do petróleo em 1979, mas quem são os similares tupiniquins de Glazyev?  Quem sabe os debates dos candidatos à presidência revelem isso para nós.

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