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Lula e a dança das caixinhas

Posted by on 15/12/2014

Para que Lula pudesse inaugurar um navio no meio da campanha presidencial de 2010, a SBM antecipou a entrega e recebeu por isso mias de US$ 25 milhões da estatal brasileira

Trecho retirado do artigo entitulado “Escândalos na Petrobrás”, publicado no jornal O Globo de 14 de dezembro de 2014

“Não havia com sair dessa. E não havia como dizer sim nem não”, resumiu o ex-presidente durante conversa com deputados e senadores na quarta-feira, em Brasília.

Trecho retirado do artigo “Candidato Lula volta à Zona de Conforto – Ex-presidente começa trabalho para disputar o Palácio do Planalto pela sexta vez em 2018”, publicado no jornalO Estado de São Paulo de 14 de dezembro de 2014

Na vida de todo indivíduo há um acontecimento determinado que é decisivo para a pessoa como um todo – para seu destino, suas convicções, suas paixões.

Trecho retirado do livro “O Arquipélago Gulag” de Alexander Solzhenitsyn

   “Ele ou ela tem defeitos e qualidades, como todo mundo. Ninguém é perfeito.” Prezados leitores, quem de vocês nunca ouviu ou repetiu isso? Como se diz em francês, ça va sans dire, é algo tão óbvio a todos, tão evidente por si que nem nos damos ao trabalho de discutir a veracidade do conteúdo. E no entanto, por mais que racionalmente saibamos que as pessoas são uma mistura de coisas boas e ruins, é sempre difícil lidar com isso na prática, principalmente quando somos vítimas da parte “podre”.

    O fato é que nossa mente tende a classificar tudo e acabamos colocando os indivíduos na caixa dos bons e dos ruins. Quando uma pessoa da caixa dos bons realiza algo típico das pessoas da caixa dos ruins espantamo-nos, decepcionamo-nos, e a depender da intensidade da reversão de expectativas, consideramo-nos ludibriados e passamos a classificar a pessoa na outra caixa, a despeito do seu histórico de bom comportamento: nosso cérebro, reconfigurado para outro modo, passa a ver com outros olhos as atitudes e comportamentos de outrora.Algo ruim realizado por alguém ruim só reforça nossas ideias e torna-nos orgulhosos do nosso tirocínio. Talvez a hipótese mais desafiadora seja aquela em que um ser classificado como mau surpreende positivamente. Não é possível refugiarmo-nos no papel de vítima como no primeiro caso, nem satisfazermos nossa vaidade como no segundo: é preciso ter coragem de rever seus pré-conceitos, suas premissas, o que pode ser doloroso para quem se acostumou a uma rotina mental reconfortante.

    Tudo isso para dizer que nossa reação às escolhas morais das pessoas está longe de ser equilibrada, e a classificação nas caixinhas fica difícil. Sem mais delongas, coloco a pergunta: Luiz Inácio Lula da Silva é mocinho ou bandido? O óbvio ululante (sem trocadilhos) é que ele é nem um nem outro, ou melhor é uma mistura dos dois, mas a caixinha é necessária em primeiro lugar porque cada um de nós brasileiros tem uma reação instintiva ao ex-presidente, figura onipresente em nossas vidas desde a primeira eleição presidencial de 1989, ditada pela vivência pessoal de cada um que leva a uma certa conformação intelectual e moral. Em segundo lugar, há uma razão prática: pelo andar da carruagem ele será novamente candidatoem 2016 e teremos que classificá-lo de qualquer forma na turma dos vencedores ou dos perdedores.

    A pergunta parece-me pertinente no momento em que estamos em meio às investigações do maior escândalo de corrupção da história do Brasil, coisa de mais de um 1 bilhão de reais, de acordo com o Ministério Público. Os desdobramentos do caso podem ter um efeito funesto sobre o segundo mandato da dona Dilma, tornar a oposição no Congresso mais renhida, feroz, louca para obstruir toda e qualquer iniciativa de um governo que já começa manchado pela lama das propinas que serviram para financiar campanhas políticas. Em suma, a Operação Lava-Jato da Polícia Federal tem tudo para instigar o Fla Flu que foi a tônica daeleição presidencial de outubro. E não há como negar que Lula é o chefe de uma das torcidas organizadas que estão lutando no ringue que é nossa democracia, no caso o líder máximo do Partido dos Trabalhadores.

    A esta altura da nossa vida republicana é hora de fazermos uma constatação, independentemente do que Lula fez de bom ou de ruim enquanto esteve na Presidência, e do que fará se voltar. O homem claramente tem um projeto de poder, isto é, de manter-se no Executivo com seu partido por décadas a fio. E para concretizar esse projeto vale tudo, inclusive usar a Petrobrás, a maior empresa do país, como cabo eleitoral, conforme asinvestigações mostraram a respeito do contrato com a empresa holandesa SBM.Quando digo vale tudo, quero dizer que Lula e sua turma utilizarão todos os recursos de que dispõem para conseguir seu intento. Alguns dirão que isso mostra que já o classifiquei na caixinha dos maus. Neste sentido sim, com certeza, assim como classifico Fernando Henrique Cardoso que moveu céus e terra para aprovar a emenda da reeleição que o beneficiava, e como classifico Rafael Correa, presidente do Equador, que já vi ao vivo, tem um raciocínio muito claro e sabe como funciona o mundo, ao contrário de uma ingênua candidata a presidente que ficava melhor no papel de palestrante motivacional. Para quem não sabe, Rafael Correa quer mudar a Constituição do Equador para poder se eleger indefinidamente.Não digo que me decepcionei com ele, pois a mosca azul do poder quando pica deixa uma impressão indelével.

    Neste ponto devo fazer uma ressalva: em minha opinião Lula é mais deletério do que Fernando Henrique porque este já pendurou as chuteiras e sua vaidade agora restringe-se a pontificar sobre os assuntos do momento quando é chamado a fazê-lo. O ex-metalúrgicoestá longe de se aposentar e as paixões que sua figura provoca ainda influenciam os rumos da nossa política, tornando o diálogo entre governo e oposição difícil, especialmente se considerarmos que nossa oposição em matéria de decoro e improbidade administrativa deixa tão a desejar quanto a situação, o que dá munição a esta para colocar-se de vítima daconspiração de perdedores.

    Qual terá sido o ponto de inflexão de Lula, isto é, o momento em que ele se cansou do papel de candidato de esquerda marginal emandou seus escrúpulos morais para as cucuias (aliás como FHC, que disse que deveriam esquecer o que havia escrito)? O mais provável é que o gosto amargo da derrota para Fernando Collor de Mello, um arrivista de Alagoas, tenha sido sentido por Lula como uma tremenda injustiça para alguém que como ele estava na luta política há décadas. Daquela eleição o líder do Partido dos Trabalhadores deve ter tirado a lição de que para fazer o bem aos brasileiros era preciso sujar as mãos e assim ele o fez,rendendo-se às exigências do capital financeiro, rendendo-se à necessidade de acordos com aqueles mesmos políticos que outrora ele havia denominado de picaretas. Os defensores de Lula dirão que é um sinal de maturidade, saber negociar para garantir certas conquistas. De fato, mas me parece quehá um momento em que a negociação e a tergiversação devem parar em nome de um projeto de país.

     O que Lula quererá em 2016? Expandir o Bolsa Família? Preservá-lo? Isso pode ser feito por candidatos da oposição que já se comprometeram com o programa. Ou simplesmente permanecer no poder pelo prazer de fazê-lo, utilizando a máquina pública como seu instrumento principal? Em última análise, colocar alguém na caixa dos bons ou dos maus depende de certos detalhes que mudam totalmente a perspectiva. Eu definitivamente coloco Lula na caixa dos maus porque acho que ele já exagerou na dose de apego ao poder e não tem nada mais a oferecer ao Brasil, além do seu próprio carisma e do seu passado de realizações.

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